quinta-feira, 14 de julho de 2011

DECIFRA-ME OU DEVORO-TE. O MUNDO É UM MOINHO!

Não passaria em branco. Moinhos de Vento, de Paulo Botelho, pela All Print, São Paulo: 2011 é mais do que uma seleção de boas crônicas. Uma cascata de arte, luz e amabilidade. Um despertar para as múltiplas janelas da vida. Paulo Botelho conduz o leitor por vias da intelectualidade com incrível vanguardismo. Usa das palavras com esmero e dá uma saraivada de conhecimento clássico, contemporaneidade que enriquece a alma mais sedenta de estética literária. A cada crônica, uma citação como luva para o leitor. Elas parecem as batidas de Molière ao anteceder a abertura das cortinas ou ao reiniciar após o intervalo de um ao outro ato do espetáculo. Cita Sófocles, Édipo Rei: “Decifra-me ou devoro-te”, mais que um clássico da tragédia grega, um símbolo de conhecimento de dramaturgia. Cartola(Angenor de Oliveira), O mundo é um moinho: “Ouça-me bem, amor. Preste atenção, o mundo é um moinho, vai triturar teus sonhos, tão mesquinho, vai reduzir as ilusões a pó!” A Lembrança de Cartola, o eterno poeta do morro no Rio de Janeiro, por si só já é plena de ternura e bom gosto. Mas, não fica por aí, não. Vejam só: Quantas estradas deve um homem percorrer antes que você o chame de homem? Sabem a quem pertence este verso? Bob Dylan. Para não ser bizarro, cair no erro de não citar outros exemplos que ilustram Moinhos de Vento, perdoem-me. É uma fartura deles que não caberia aqui. O livro do Paulo é uma alegria que encanta o leitor. Um oásis.
A justificativa para Moinhos de Vento é que o livro fala de “diversificados e complexos moinhos a remover: no meio ambiente, na gestão logística, na comunicação empresarial, nos negócios, nas políticas públicas e, sobretudo, nas relações humanas. Trata, de forma estrutural, dos moinhos que insistem em querer triturar o que há de melhor na inteligência humana.” Sujeito generoso e modesto é o Paulo Botelho em sua justificativa. Moinhos de Vento é um mergulho no universo da música, da literatura e da dramaturgia universal. Sófocles, Shakespeare, Hegel, Brecht, Godard, Santo Agostinho, Machado de Assis, Fernando Pessoa,Tolkien, Schweitzer, Kant, Pellegrino e outros presentes no corpo das crônicas. É modéstia demais reduzir Moinhos de Vento a uma quadra espetacular e envolvente da antropologia social da vida humana na urbes. Moinhos de Vento transcende! Igual a passagem de Alcides, um surdo-mudo, pequeno e frágil; um “Quixote do universo sustentável”. Vivia na roça, no eixo Muzambinho-Monte Belo; um multiplicador do desenvolvimento sustentável que chorava por não evitar a morte de um animal. Brigava para impedir a derrubada de uma árvore. Tomava providências — todas que estivesse ao seu alcance ― para socorrer alguém com fome! Emocionante a passagem com o Presidente Juscelino Kubitschek, em Caratinga, na inauguração de uma obra. Meio a multidão, um homem com esforço vem ao encontro. JK pára estarrecido. Era um “leproso enrolado em sacos de estopa”, rosto deformado, porém, os olhos suaves! Juscelino o abraça afetuosamente e “ele se afasta e, de costas para a multidão perplexa, chora de emoção!”. JK era médico. Conhecia com profundidade as mazelas da vida! Paulo Botelho cita com a mesma ternura, o médico e emérito de Muzambinho, Dr. Ismael de Oliveira Coimbra, que tinha um projeto para a “cidade que incluía escolas, redes de esgotos, postos de saúde para toda a população”, mas, excluía a fonte luminosa, a reforma da igreja e a criação de um caipiródromo. Ainda com carinho lembra Dr. Samuel Assis de Toledo, médico filósofo de quem recebeu Diálogos de Platão com a seguinte recomendação: “Leia, pelo menos umas quatro vezes. O livro contém uma trilha de sintaxe mental para você entender a essência da vida.” O Paulo compreendeu a sintaxe à qual se referia Dr. Samuel de quem guardo no escritório a Historia da Filosofia: vida e ideias dos grandes filosofos, Will Durant, Editora Nacional: 1936, amarelado é bem verdade; tão valioso quanto a recomendação daquele ditoso homem ao inquieto adolescente. A verdade é que o Paulo Botelho internalizou a sugestão do Dr. Samuel Assis de Toledo e a transformou enriquecendo-a ao citar Jacques Lacan: “Os seres humanos não obedecem integralmente à relojoaria cósmica porque nascem desequipados” e conclui: “Ele queria dizer que é por meio da cultura que se constroem pontes sobre o abismo dos desentendimentos”. Moinhos de Vento é uma sintaxe que nos leva às pontes. Vamos usá-la. Leia o livro do Paulo pela All Print: http://www.allprinteditora.com.br/

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